O casamento, enquanto instituição e relacionamento interpessoal, é uma jornada complexa e multifacetada, repleta de desafios e oportunidades para crescimento. A satisfação e a durabilidade conjugal não dependem apenas do amor inicial ou da compatibilidade, mas, fundamentalmente, da capacidade dos parceiros de adquirir e aplicar habilidades de vida e competências de resolução de problemas ao longo do tempo. Este artigo científico explora a interconexão crítica entre essas habilidades e a qualidade do relacionamento conjugal. Serão abordadas as principais habilidades de vida que se mostram preditivas de sucesso conjugal, como a comunicação eficaz, a inteligência emocional, a empatia, a autonomia pessoal e a capacidade de oferecer e receber apoio social. No que tange à resolução de problemas, o foco será em estratégias construtivas para gerenciar e mitigar o conflito conjugal, incluindo a negociação, o compromisso, o perdão e a prevenção de padrões negativos de interação. Discutiremos como a falta dessas habilidades pode levar a ciclos disfuncionais, insatisfação e, em última instância, à dissolução da união. Além disso, o artigo examinará o papel de programas de educação para o casamento e da terapia de casal como intervenções eficazes para desenvolver e aprimorar essas competências. O objetivo é fornecer um arcabouço teórico e prático que sublinhe a importância das habilidades de vida e de resolução de problemas como pilares para a construção de um casamento resiliente, gratificante e duradouro no século XXI, um período de crescente individualização e fluidez nas relações.
1. Introdução
O casamento, em sua forma contemporânea, tem sido descrito como uma "relação pura" (Giddens, 1991), baseada predominantemente na satisfação mútua e na intimidade emocional, em contraste com os casamentos tradicionais, frequentemente moldados por imperativos econômicos ou sociais. Essa ênfase na dimensão afetiva e pessoal torna a qualidade da interação entre os parceiros um fator decisivo para a satisfação e a durabilidade conjugal. Longe de ser um estado estático, um casamento bem-sucedido é um processo dinâmico de adaptação, negociação e crescimento mútuo, que exige um conjunto de competências interpessoais e intrapessoais.
As habilidades de vida (life skills) referem-se a um conjunto de competências psicossociais que capacitam os indivíduos a lidar eficazmente com as exigências e desafios da vida diária (WHO, 1997). No contexto conjugal, elas abrangem desde a capacidade de autorregulação emocional e comunicação assertiva até a resiliência frente a adversidades. Intrinsicamente ligada a essas habilidades está a resolução de problemas, que no ambiente do casamento se manifesta como a capacidade de identificar, abordar e superar os conflitos e desentendimentos que são inerentes a qualquer relação íntima.
Historicamente, a pesquisa sobre o casamento focou em fatores demográficos ou socioeconômicos como preditores de sucesso. No entanto, nas últimas décadas, há um reconhecimento crescente de que as dinâmicas interacionais e as competências dos parceiros são fundamentais. Casais que demonstram alta satisfação e longevidade tendem a possuir e aplicar um repertório mais rico de habilidades para navegar os inevitáveis estresses e conflitos da vida a dois (Gottman & Levenson, 1992; Markman et al., 1993).
Este artigo propõe uma análise aprofundada da relevância das habilidades de vida e das estratégias de resolução de problemas para a construção e manutenção de casamentos saudáveis no século XXI. Exploraremos as habilidades cruciais, as abordagens eficazes para gerenciar conflitos, os perigos da ausência dessas competências e o papel transformador de intervenções como a educação para o casamento e a terapia de casal. O objetivo é evidenciar que o investimento no desenvolvimento dessas habilidades é tão vital quanto o compromisso afetivo para a construção de um vínculo conjugal resiliente e mutuamente gratificante.
2. Habilidades de Vida Fundamentais para a Qualidade Conjugal
As habilidades de vida são um conjunto diversificado de competências que permitem aos indivíduos navegar com sucesso pelos desafios da vida. No casamento, elas se manifestam na forma como os parceiros interagem, gerenciam suas emoções e abordam os problemas em conjunto.
2.1. Comunicação Eficaz
A comunicação é, sem dúvida, a pedra angular de qualquer relacionamento bem-sucedido. No casamento, ela envolve mais do que apenas falar; é a capacidade de expressar pensamentos, sentimentos e necessidades de forma clara, ouvir ativamente e compreender a perspectiva do parceiro.
Escuta Ativa: Concentrar-se plenamente no que o parceiro está dizendo, tanto verbalmente quanto não-verbalmente, sem interrupções ou julgamentos prematuros. Envolve parafrasear e refletir o que foi ouvido para garantir a compreensão (Gottman, 1994).
Expressão Assertiva: Comunicar desejos e necessidades de forma direta e respeitosa, usando "eu" declarações (e.g., "Eu me sinto X quando Y acontece") em vez de acusações ("Você sempre faz Z").
Validação Emocional: Reconhecer e legitimar os sentimentos do parceiro, mesmo que não se concorde com a perspectiva dele. Isso cria um ambiente de segurança e compreensão.
Comunicação Não-Verbal: A atenção à linguagem corporal, tom de voz e expressões faciais, tanto próprias quanto do parceiro, é crucial para captar mensagens completas e evitar mal-entendidos.
A falta de comunicação eficaz é frequentemente citada como uma das principais causas de insatisfação e dissolução conjugal (Markman et al., 1993).
2.2. Inteligência Emocional
A inteligência emocional (IE), conforme definida por Goleman (1995), refere-se à capacidade de reconhecer, compreender e gerenciar as próprias emoções e as emoções dos outros. No casamento, isso se traduz em:
Autoconsciência Emocional: Entender as próprias emoções, seus gatilhos e como elas afetam o comportamento e a interação com o parceiro.
Autorregulação Emocional: A capacidade de controlar impulsos, gerenciar emoções disruptivas (raiva, frustração, ansiedade) e adaptar-se a situações estressantes. Isso é vital durante os conflitos, evitando a escalada.
Empatia: A capacidade de se colocar no lugar do parceiro, compreender seus sentimentos e perspectivas, mesmo que diferentes dos seus. A empatia promove a conexão e a validação mútua.
Habilidades Sociais/Relacionais: A aplicação da inteligência emocional na interação, construindo rapport, influenciando positivamente e gerenciando a dinâmica da relação.
Casais com alta inteligência emocional tendem a lidar melhor com o estresse, a resolver conflitos de forma mais construtiva e a ter maior satisfação (Roberts & Noller, 2005).
2.3. Resiliência Conjugal
A resiliência é a capacidade de se adaptar e se recuperar de adversidades, estresse e desafios. Em um casamento, isso significa:
Flexibilidade: Abertura para mudanças e adaptação a novas circunstâncias (e.g., nascimento de filhos, perda de emprego, mudanças na saúde).
Otimismo e Perspectiva Positiva: Manter uma visão esperançosa e focar nas soluções em vez de apenas nos problemas.
Crescimento Pós-Traumático: A capacidade de usar experiências difíceis como oportunidades para fortalecer o relacionamento e aprender.
Apoio Mútuo: Oferecer e receber suporte emocional, prático e instrumental do parceiro em momentos de necessidade, criando um senso de segurança e solidariedade.
Casais resilientes são capazes de atravessar crises e emergir mais fortes, solidificando seu vínculo (Walsh, 2002).
2.4. Autoconsciência e Desenvolvimento Pessoal
Um casamento saudável se beneficia da capacidade de cada indivíduo de se autoavaliar, reconhecer suas próprias contribuições para os problemas e buscar crescimento pessoal.
Responsabilidade Pessoal: Reconhecer a própria parcela de responsabilidade em conflitos e desafios, em vez de culpar unicamente o parceiro.
Autonomia e Diferenciação: Manter um senso de identidade individual e autonomia dentro do relacionamento, evitando a fusão excessiva, o que permite que cada parceiro contribua com sua singularidade.
Busca por Crescimento: Estar aberto a aprender, aprimorar habilidades e evoluir como pessoa, o que enriquece a relação.
3. Estratégias de Resolução de Problemas no Casamento
O conflito é inevitável em qualquer relacionamento íntimo. A diferença entre casamentos bem-sucedidos e os que falham não reside na ausência de conflitos, mas na maneira como são abordados e resolvidos.
3.1. Abordagens Construtivas ao Conflito
Abordagem Suave da Queixa (Soft Start-up): Em vez de iniciar uma discussão com críticas ou acusações, começar com uma declaração sobre um sentimento pessoal e uma necessidade, usando "eu" declarações (Gottman, 1994). Ex: "Eu me sinto um pouco sobrecarregado quando vejo a louça acumulada, e preciso de ajuda para organizar." em vez de "Você nunca lava a louça!".
Negociação e Compromisso: Estar disposto a ceder e encontrar um terreno comum. Isso não significa que um parceiro "ganha" e o outro "perde", mas que ambos encontram uma solução mutuamente aceitável que atenda às necessidades de cada um em algum grau.
Brainstorming de Soluções: Em vez de focar no problema em si, o casal deve se concentrar em gerar múltiplas soluções possíveis antes de escolher a melhor.
"Reparo" Durante o Conflito: A capacidade de fazer e aceitar tentativas de reparação durante uma discussão (e.g., um pedido de desculpas, uma piada, um sinal de afeto) para desescalar a tensão e evitar que o conflito saia do controle (Gottman, 1994).
Foco na Solução, Não na Culpa: Mudar o foco da identificação de quem é o culpado para a busca de uma solução que beneficie ambos os parceiros.
3.2. Gerenciamento de Conflitos Inerentes (Problemas Perpétuos)
John Gottman (1994) argumenta que 69% dos conflitos em casamentos são "problemas perpétuos" – questões fundamentais de personalidade ou estilo de vida que não podem ser "resolvidas", mas apenas gerenciadas.
Aceitação Mútua: Reconhecer que algumas diferenças são intrínsecas ao parceiro e que a aceitação é mais produtiva do que a tentativa incessante de mudança.
Diálogo Contínuo: Manter uma conversa aberta sobre essas questões, mesmo que não haja uma "solução" final, para evitar que se tornem fontes de ressentimento.
Encontrar Maneiras de Convivência: Desenvolver estratégias para "dar a volta" ou "negociar em torno" dessas diferenças, de modo que não minem o relacionamento.
3.3. Evitar Padrões Destrutivos
A pesquisa de Gottman (1994) identificou os "Quatro Cavaleiros do Apocalipse" como preditores de divórcio, que são padrões de resolução de problemas disfuncionais:
Crítica: Atacar o caráter do parceiro em vez de seu comportamento.
Desprezo: Atacar o senso de autoestima do parceiro, com sarcasmo, cinismo, insultos, ridicularização, roll de olhos.
Defensividade: Vitimização, desviar a culpa e não aceitar a responsabilidade.
Bloqueio (Stonewalling): Recusa em se engajar na discussão, retirando-se emocionalmente ou fisicamente.
A capacidade de reconhecer e evitar esses padrões é crucial para uma resolução de problemas saudável.
3.4. Perdão
O perdão, tanto para pequenas irritações quanto para mágoas mais profundas, é uma habilidade vital. Ele não significa esquecer ou absolver o comportamento, mas liberar o ressentimento e a raiva, permitindo que a relação avance. O perdão promove a restauração da confiança e a cura emocional (Gordon & Baucom, 1998).
🧱 Mitos sobre o casamento e a resolução de conflitos
💔 “Se fosse amor de verdade, não haveria brigas”
Você acha que desentendimentos são sinal de fracasso, mas todo casal saudável aprende a discutir com respeito.
🦸 “Um de vocês sempre tem que ceder completamente”
Ceder demais vira anulação. O equilíbrio está em negociar, não em perder-se no outro.
🎭 “Casamento feliz é sem segredos e com total transparência”
Você pode ter privacidade sem esconder segredos. O equilíbrio entre individualidade e confiança é essencial.
🎬 “É melhor evitar brigas do que enfrentá-las”
Fugir de conflitos acumula tensão. Enfrentá-los com diálogo maduro é o que fortalece a união.
🕊️ “Pedir desculpas é sinal de fraqueza”
Na verdade, pedir desculpas mostra força emocional e comprometimento com a relação.
🧙 “Ter química basta para o casamento funcionar”
Química inicial ajuda, mas o dia a dia exige habilidades de escuta, resiliência e cooperação.
🎡 “Rotina acaba com qualquer casamento”
A rotina é inevitável. O que esfria a relação é a falta de intenção em reinventar momentos simples.
💸 “Problemas financeiros são apenas sobre dinheiro”
Eles quase sempre são sobre valores, prioridades e comunicação — não sobre números.
🧠 “Usar técnicas de psicologia no casamento é manipulação”
Aplicar habilidades emocionais e cognitivas ajuda a resolver sem atacar, e não a controlar.
👑 “Quem ama não precisa explicar nada”
Na vida real, até o amor precisa de explicação, ajuste, cuidado e presença consciente.
🔍 Verdades elucidadas que você precisa encarar
🧭 O casamento é um aprendizado contínuo
Você evolui ao lado do outro. Casar é um curso diário de empatia, escuta e adaptação.
🗣️ Comunicação é mais importante que afinidade
Você pode amar e ainda assim se afastar sem um canal de conversa constante e sincero.
🫂 Conflitos bem conduzidos fortalecem vínculos
Ao resolver bem um impasse, você gera respeito mútuo e segurança emocional.
🎯 Saber negociar é mais útil que ter razão
Ganha mais quem constrói consenso do que quem sempre vence as discussões.
🧘 Autoconhecimento é ferramenta de casal
Conhecer tuas emoções e limites te ajuda a reagir com clareza e amor mesmo em crises.
🛠️ Soluções práticas exigem paciência estratégica
Não se resolve tudo com emoção imediata. Planejar também é amar.
🕰️ Casamento exige manutenção constante
Amor não se sustenta sozinho. Ele precisa de tempo, atenção e ajustes contínuos.
📚 Habilidades de vida são aprendíveis
Você pode desenvolver empatia, escuta ativa, assertividade e inteligência emocional.
👣 Caminhar junto inclui tropeços
Você vai errar. O outro também. O segredo está em construir um caminho possível entre dois mundos.
❤️ Amor é escolha diária, não impulso
A paixão acende, mas o amor só se mantém se for cultivado dia após dia, com escolhas conscientes.
🔧 Projeções de soluções para um casamento resiliente
🧩 Aprender escuta ativa evita mal-entendidos constantes
Você ouve de verdade ou só espera sua vez de falar?
🛎️ Criar rituais simples de conexão reduz distanciamento
Um café juntos ou um bilhete sincero podem mudar o dia.
🌈 Validar emoções antes de resolver conflitos evita escaladas
Dizer "entendo que você esteja frustrado" já é meio caminho para a paz.
🧠 Desenvolver inteligência emocional gera empatia real
Você reage menos e compreende mais com maturidade emocional.
🎲 Ter conversas difíceis sem fugir cria segurança afetiva
Enfrentar o desconforto mostra compromisso, não guerra.
🔁 Revisar acordos periodicamente previne frustrações
O que funcionava no início pode não servir mais. E está tudo bem.
📉 Estabelecer limites respeitosos evita desgaste emocional
Você pode dizer “não” com carinho e continuar presente.
🌍 Compartilhar visões de futuro gera pertencimento
Casais com sonhos alinhados se fortalecem nas tempestades.
🧪 Buscar ajuda terapêutica acelera a maturidade conjunta
Você não precisa esperar o caos para procurar apoio profissional.
🧤 Treinar empatia ativa evita respostas automáticas
Você sente com o outro, não apenas por ele. Isso transforma a conexão.
📜 Os 10 Mandamentos das habilidades de vida no casamento
💬 Escutarás com atenção e sem interrupções
Tu não falas só para responder, mas para compreender e acolher.
🔄 Negociarás com gentileza e firmeza
Tuas vontades importam, mas nunca serão absolutas.
🧘 Responderás com inteligência emocional
Tu não deixarás que o impulso dite teus atos nos conflitos.
💡 Buscarás soluções e não culpados
Tu transformarás reclamações em propostas construtivas.
🪞 Cuidarás do teu próprio equilíbrio antes de exigir do outro
Tu te responsabilizarás pela tua felicidade antes de delegá-la.
🧭 Alinharás objetivos de vida com teu parceiro
Tu saberás para onde caminha teu casamento — juntos.
📆 Renovarás compromissos com ações e não só com promessas
Tu farás do “eu te amo” uma atitude, não uma rotina verbal.
🛠️ Manterás tua relação como se fosse uma construção
Tu entenderás que nada floresce no abandono emocional.
🤝 Praticarás o companheirismo antes do romantismo
Tu serás parceiro(a) na dor, na dúvida, na decisão.
🕊️ Escolherás o amor com liberdade e verdade
Tu amarás sem possessão, com leveza e com presença consciente.
4. Consequências da Ausência de Habilidades
A falta de habilidades de vida e de resolução de problemas no casamento pode levar a um ciclo vicioso de insatisfação e disfunção.
Escalada do Conflito: Pequenos desentendimentos podem escalar rapidamente para grandes discussões, resultando em mágoas e ressentimento acumulado.
Distanciamento Emocional: A incapacidade de comunicar eficazmente ou resolver problemas pode levar a um distanciamento gradual, onde os parceiros se sentem incompreendidos ou não apoiados.
Aumento do Estresse e Problemas de Saúde: O estresse crônico resultante de um relacionamento disfuncional pode ter sérias implicações para a saúde mental e física de ambos os parceiros (Kiecolt-Glaser & Newton, 2001).
Diminuição da Satisfação Conjugal: A insatisfação crônica e a falta de prazer na relação podem levar à busca por satisfação fora do casamento ou à dissolução.
Impacto nos Filhos: Casamentos com altos níveis de conflito não resolvido têm um impacto negativo significativo no bem-estar e no desenvolvimento socioemocional dos filhos (Davies & Cummings, 1994).
Ciclos Disfuncionais: A repetição de padrões de interação negativos, onde os mesmos problemas surgem repetidamente sem resolução.
5. Desenvolvimento e Aprimoramento de Habilidades: Intervenções
Felizmente, as habilidades de vida e de resolução de problemas podem ser aprendidas e aprimoradas. Programas de educação e terapia são ferramentas eficazes.
5.1. Educação para o Casamento (Pre-Marital and Marital Education)
Programas de educação para o casamento visam equipar os casais com as ferramentas necessárias antes ou durante a união.
Foco em Habilidades: Geralmente abordam comunicação, resolução de conflitos, gestão financeira, expectativas realistas e desenvolvimento de intimidade.
Metodologias: Workshops, seminários, sessões com conselheiros, uso de materiais didáticos e exercícios práticos.
Evidências de Eficácia: Pesquisas mostram que casais que participam desses programas tendem a ter maior satisfação conjugal e menores taxas de divórcio (Stanley et al., 2006).
Exemplos de programas incluem PREP (Prevention and Relationship Enhancement Program), CoupleCARE e Strong Start. Eles ensinam os casais a discutir questões difíceis de forma construtiva, a expressar afeto e a construir um senso de parceria.
5.2. Terapia de Casal (Couples Therapy)
A terapia de casal é uma intervenção profissional para casais que enfrentam dificuldades e buscam aprimorar seu relacionamento ou resolver conflitos.
Abordagens Terapêuticas:
Terapia Cognitivo-Comportamental para Casais (CBCT): Foca em identificar e mudar padrões de pensamento e comportamento disfuncionais que contribuem para o conflito (Epstein & Baucom, 2002). Ensina habilidades de comunicação e resolução de problemas.
Terapia Focada nas Emoções (EFT): Baseada na teoria do apego, ajuda os casais a identificar e expressar suas necessidades emocionais mais profundas, trabalhando para reestruturar padrões de interação negativos e fortalecer o vínculo de segurança (Johnson, 2004).
Terapia Sistêmica: Vê o casal como um sistema interconectado, onde o problema de um afeta o outro. Foca em mudar os padrões de interação dentro do sistema.
Terapia de Gottman: Desenvolvida por John Gottman, foca em ensinar os casais a construir "mapas de amor" (conhecer o mundo interno um do outro), a nutrir carinho e admiração, a se aproximar um do outro, a gerenciar conflitos e a criar um significado compartilhado.
Objetivos da Terapia: Não apenas resolver problemas específicos, mas também equipar os casais com as habilidades e ferramentas para lidar com futuros desafios de forma autônoma. Ajuda a quebrar ciclos viciosos e a construir novos padrões de interação.
Evidências de Eficácia: A terapia de casal é amplamente reconhecida como uma intervenção eficaz, com taxas significativas de melhora na satisfação conjugal (Shadish & Baldwin, 2003).
6. Desafios e Futuras Direções
Apesar da clareza sobre a importância das habilidades de vida e resolução de problemas, há desafios e oportunidades para a pesquisa futura.
Implementação em Larga Escala: Embora os programas educacionais e terapêuticos sejam eficazes, a adesão e o acesso podem ser limitados. Como escalar essas intervenções para alcançar mais casais?
Adaptação Cultural: As habilidades e estratégias podem precisar ser adaptadas a diferentes contextos culturais, que possuem suas próprias normas de comunicação e resolução de conflitos.
Tecnologia e Habilidades Digitais: Como as novas tecnologias (aplicativos de relacionamento, comunicação online) impactam o desenvolvimento e a aplicação dessas habilidades? Novos desafios de comunicação surgem no ambiente digital.
Prevenção Primária: Além da intervenção quando problemas já existem, como programas de educação podem ser integrados mais cedo na vida das pessoas (e.g., nas escolas) para desenvolver habilidades interpessoais essenciais?
Pesquisa Longitudinal: Acompanhar casais ao longo de décadas para entender como as habilidades evoluem e como sua aplicação impacta a longevidade e a satisfação do casamento.
Intersecção com Saúde Mental: Aprofundar a compreensão de como a saúde mental individual (ansiedade, depressão) afeta a capacidade de aplicar essas habilidades e como a melhoria das habilidades pode, por sua vez, impactar a saúde mental.
7. Conclusão
O casamento no século XXI, moldado pela individualização e pela busca por relações significativas, exige mais do que apenas sentimentos de amor; exige um investimento contínuo no desenvolvimento de habilidades de vida e competências de resolução de problemas. Este artigo demonstrou que a comunicação eficaz, a inteligência emocional, a resiliência, a autoconsciência e a capacidade de aplicar estratégias construtivas de resolução de conflitos são pilares fundamentais para a qualidade e a durabilidade conjugal.
A ausência dessas habilidades pode levar a um ciclo destrutivo de insatisfação, estresse e eventual dissolução. No entanto, a boa notícia é que essas competências não são inatas; elas podem ser aprendidas e aprimoradas através de programas de educação para o casamento e, quando necessário, por meio da terapia de casal. Essas intervenções fornecem as ferramentas e o espaço para que os parceiros desaprendam padrões disfuncionais e construam novas formas de interação, fortalecendo seu vínculo.
Em um mundo onde as relações são cada vez mais fluidas e a pressão sobre os indivíduos para construir suas próprias biografias é imensa, a capacidade de negociar, de se adaptar, de se perdoar e de crescer juntos torna-se o verdadeiro alicerce de um casamento próspero. O investimento no desenvolvimento dessas habilidades é, portanto, um investimento no bem-estar conjugal, familiar e individual, contribuindo para a construção de relações mais resilientes, gratificantes e significativas na sociedade contemporânea.
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